quinta-feira, 9 de julho de 2015

Rotas de Fuga

Estrofes arrancadas
desse peito dilacerado
pela realidade
nua e crua.

Tomaste por
impossível
o resgate
do ensimesmamento
dadas as rotas de fuga
deste presídio
que tu mesmo
escolheste
por moradia.
Os parques verdejantes
e tudo
que está a seu dispor
no lado de fora
te esperam pacientemente.

Abre as portas
dessa cela suja
e mal cheirosa,
sai pelo pátio
a bramir o gosto
fugidio de tua
liberdade.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Filtros da Realidade

De onde devemos partir para o auto-descobrimento? Das ideias que fazemos de nós? Do papel que desempenhamos no dia-a-dia? Ou será que podemos ir um pouco mais a fundo na nossa essencialidade? É a partir do olhar puro sobre nossa essência que contemplamos a realidade do ser. Essa realidade, além de todos os conceitos possíveis e imaginários que possamos construir, é ilimitada e livre. É a própria realidade de todas as coisas, só que nem sempre enxergamos as coisas que nos circundam como aquilo que É, sempre temos filtros a partir do qual definimos o que vemos, o que ouvimos, o que tocamos. Removendo os filtros fica o que?
Estou escrevendo agora sentado em frente ao computador. O que é isso que vejo? O que é esse barulho que soa ao digitar? O que é esse silêncio sepulcral que vem de fora, já agora no cair da noite, com pouco ou quase nada a soar? O que é esse silêncio?
Se não dou nome a nada disso, se não me apresso em dar uma definição e pronta resposta a todas essas perguntas, passo a me aproximar do que é de mais íntimo. É a própria intimidade que dá o sabor da liberdade, pura e simplesmente livre de ser e ver, tocar e ouvir.
A tradição Zen, por essência, vai mostrando ao praticante, e sem dizer uma única palavra, aquilo que está estatelado na nossa frente e não vemos com os olhos do mundo.
Mas para se aprofundar nessa realidade, não é regra estarmos vinculados a qualquer tradição pois em realidade essa realidade não tem nome, nem é uma escola, nem tampouco é uma organização religiosa. Essa realidade está vinculada tão somente à vida em si, ficando a cargo de tais tradições serem utilizadas como uma ferramenta para abrir os olhos da alma, por assim se dizer.

Jogos Mentais

Vejo que muitas das relações que travamos vêm embutidas sutis contratos sociais, onde eu, enquanto individualidade que me reconheço, ajusto com o outro - seja quem for - um acordo do que iremos falar ao nos encontrarmos, ou até que ponto irá nosso relacionamento. Essa é uma manobra do ego formado pelas duas partes da relação, eu e o outro, querendo coisificar algo que está além de acordos ou tratos. O relacionamento, seja em qual forma for, deve ser a personificação da abertura do meu ser ao outro, que se abre a mim, e só a partir daí haverá uma relação saudável, não programada. Mas não é isso o que acontece em geral, e às vezes o jogo é tão sutil que nenhuma das partes reconhece que está jogando o jogo do ego.

Conceitos e rótulos

O que é o que somos em verdade? Somos aquilo que pensamos, ou seja, um médico, um advogado? Em verdade, somos isso e muito mais, pois o tanto de vida que corre em nós não está ligada a esses conceitos específicos, nem tem nenhuma categoria pra nos encaixar. Nós, nosso ego é que nos encaixa. Pense que viver sem esse encaixe em categorias e conceitos nos torna indivíduos destituídos de uma identidade fixa, o que é maravilhoso, pois podemos ser tudo e ao mesmo tempo nada.
Há um princípio inteligente perpassando a tudo e em especial neste corpo-mente, que independe de nossa vontade de querer para que ele se manifeste. Somos Isso, se é que tal categoria pode chegar tão próximo do que ela está tentando apontar. Somos esse princípio atuante, que à noite nos torna sonolentos, de dia nos dá energia para realizar as tarefas cotidianas.
Tal princípio está atuando em tudo e nós não percebemos justamente por estarmos nos encapsulando a cada momento, e assim deixando de reparar que tudo está se movendo numa sinfonia de ordem e caos, nossas células sendo repostas automaticamente, tudo acontecendo independentemente de nossa vontade pessoal e egóica.
Viver a partir do que esse conceito aponta nos tira dos ombros uma pesada carga que carregamos inutilmente, e nada mais faz do que criar uma espessa camada de fumaça sobre a realidade.

terça-feira, 7 de julho de 2015

Experimentar

Simplesmente sendo, ouço os barulhos que foram deixados pra trás na correria midiática da vida que está sempre a nos espreitar, ao ponto de achar que tem algo errado em sentar no sofá da sala e mais nada, com a televisão desligada.
O mesmo pode ser visto quando estamos num ônibus no trânsito, ou numa sala qualquer, que a princípio nos dá uma sensação inquieta, e pararmos para perceber o quanto de vida há para ser degustada até numa situação dessas: a pessoa lendo o jornal, a forma do cabelo dela, as atitudes das pessoas sentadas na mesma sala, o telefone que toca e a secretária atende, ou até mesmo o quanto de vida está pulsando dentro da gente justamente num local como esse. Se o nosso corpo está confortável ou não, se o ar condicionado está forte e o vento está soprando forte na nuca, enfim, até em momentos aparentes de que nada está acontecendo, se tivermos o olhar puro de uma criança de 2 anos de idade, voltaremos a esse passado maravilhoso que tivemos em nossas vidas e experimentaremos, como ela, tudo que está a nossa volta.

Desenvolvimento Integral

Falar em controle, em querer que as coisas aconteçam da forma que imaginamos, é arrogar-se em não querer deixar que a vida seja vida. Tudo que acontece vem de forma natural, ao deixar-se levar pela vida, botando nosso coração em suas mãos como o pequeno bebê está totalmente entregue aos cuidados de sua mãe.
O problema é o desejo, pois ela é a mola mestra da sociedade em que vivemos, e está estampada na mídia em mensagens subliminares, que nos dá a certeza que a realidade é o justo contrário: tudo depende de nós, e atingiremos os objetivos se nos empenharmos ao máximo no que for. É claro que qualquer ação pré-meditada é fruto do ego no indivíduo que não se deixa ser.
Cada indivíduo tem sua configuração, e se a programação é do mesmo ser um trabalhador inverterado, assim ele será. Se a sua configuração é a de alguém que move a passos lentos, e não liga muito para o tema da ambição, a vida não o rejeita, e dá a oportunidade de deixar tudo ser.
Vendo assim, podemos concluir que o passo mais importante para o indivíduo é entregar de todo coração ao seu próprio coração todas as nuances de atitudes tomadas durante os dias, sabendo que o que tiver que ser a partir deste corpo-mente, assim será.
A confiança tem como subproduto uma vida mais harmônica, o que não quer dizer que na entrega não haverá muita ação, que pode ser o justo contrário, dependendo da configuração de cada um.
Quando não há obstáculo impedindo a energia vital de se manifestar neste corpo-mente, acho até que há mais comprometimento seja nas relações interpessoais, seja no trabalho exercido, podendo-se chegar a ser - sem que haja qualquer plano neste sentido - uma luz a brilhar pelos olhos, em benefício do desenvolvimento integral do ser humano.

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Jogos de Bondade

Mais do que jogos de bondade, que são uma simples manifestação do ego querendo assimilar-se ao ser em equilíbrio, podemos simplesmente relaxar dentro da existência, do dia-a-dia e tudo que demanda nossa atenção nele.
Se não mais temos a agenda de movermos no mundo a partir da ideia que fazemos de nós mesmos, vamos notando que há um relaxar que em essência é o próprio amor.
A partir do estabelecimento dessa energia no interior, ela vai impregnando o que quer que façamos, e notamos uma sintonia muito mais forte e muito mais eficaz do que gestos de bondade.

Jogos do Ego

Delegar à vida uma tarefa que na verdade é dela, é um sinal de que a individualidade está madura o suficiente para cair, como o fruto cai da àrvore quando está maduro.
O deixar-se ser livre de intenções denota a ruptura com o jogo jogado pela maioria, do controle das situações, do que dizer, quando dizer, o que fazer, quando fazer.
Tudo é uma manobra sutil do ego querendo fazer-se perpétuo, ao passo que a simples hipótese que está sendo levantada desencadeia outra manobra sutil do ego, o medo.

O fluir da vida

E se não tiver que fazer nada por parte da intenção do sujeito, mas unicamente despojar-se desse que tem que fazer algo, que tem que tomar conta das coisas senão fode tudo. E se a vida é inteligente e sabe muito mais do que nosso eguinho o que tem que ser? E se a vida nem pensa nada, só vai rolando de forma pura em tudo? E se eu me der conta que a vida só não está rolando de forma pura aqui nesse corpo, mente e atitudes, pelo simples fato de eu estar me metendo muito em assunto que não fui chamado? E se for verdade isso tudo, que eu só estou fudendo tudo ao meter o nariz onde não devo?

Seres humanos em sua arrogância

O fluir demanda pelo nosso reconhecimento da futilidade de nos metermos no meio da vida e querer controlar as situações, sempre como o egozinho quer, do jeitinho gostoso que ele quer, criando a separação desse indivíduo da vida em toda sua aventura.
Quem sabe eu mande um dane-se pra tudo e deixar que essa energia que sustenta o Universo tenha minha permissão - alta permissão dada a importância que dou ao meu ego -, para entrar e tomar conta do show? Faz aí, porra, faz o que tu quiser fazer com essa merda!
Meu maior ídolo é o Sistema Solar, que não reclama de nada e deixa com a energia a tarefa de fazer rodar e cuidar de tudo.
Eu não! Tenho conta pra pagar, tenho que fazer outra pós-graduação pra melhorar meu currículo, e não posso ter essa confiança na tal da energia, até mesmo porque, e se não rolar isso com os humanos?

O Som Harmônico

Quem escuta a música que está tocando? É claro que sou eu, mas sobreponho a este que está escutando a música uma carcaça mental com nome, preferência musical que nada mais faz com esse simples momento do fluir do que a sobreposição. Daí, deixo pra lá a música que estou escutando e categorizo ela mentalmente, sempre egoificando algo que é primal: o som que está saindo dessa caixa de som.
Falar em som e caixa de som também é uma forma de coisificar algo que é de essência, qual seja, o som harmônico,

Relato

Sem as amarras do ego, o simples fluir da vida em todas as suas nuances é simplesmente reconhecido como algo sempre existente.
Mas se eu enquanto individualidade tomei a poção mágica do desaparecimento, o sumiço de todo o resquício da auto-referência nas ações tomadas por este organismo, quem então reconhece isso?
O fato é: há uma música tocando ao fundo, uma pequena dor no estomago sem a auto-referência.
Até o fato de estar escrevendo contando essa historinha bonitinha de um ser sem ego já condensa o fluir, pois há notadamente uma intenção egóica em relatar isso. Talvez sem essa intenção eu nem estivesse escrevendo, estaria escutando música deitado.

domingo, 5 de julho de 2015

Sem título

Rastejante,
chega ao termo
de suas idas e vindas
ao vale das sombras.

Desperta!
E toma o aprumo
erguendo seus caminhos
nos vales e montes,
pelos quais adentrará.

Esqueça tudo
que faça referência
ao pequeno Si mesmo,
e viva livremente
cantando tua canção
de dor e de amor.